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quinta-feira, 12 de abril de 2012

Sobre a violência que sofri no ato do Clube Militar.


Sobre a violência que sofri no ato do Clube Militar.
por Gustavo Santana, terça, 10 de Abril de 2012 às 20:50 ·

Passados dez dias de tudo que aconteceu comigo no ato do Clube Militar, depois de sete dias de internação, uma cirurgia para reconstruir meu úmero dilacerado pela pancada do cassetete de um PM, de receber centenas de ameaças e ver as pessoas ao meu redor sofrerem com essa situação toda, percebo o quanto a violência pode corroer nossa vida e abalar as nossas crenças.

Ainda estou muito triste e ferido na carne com o que aconteceu, relutei muito em escrever sobre a situação toda porque não quero exposição e até tenho achado muito errada a forma como alguns do lado de cá tem tratado tudo. Acho que não é nosso papel usar o que aconteceu para posar de herói ou de coitadinho, não me considero nem um nem outro e não quero ser visto como tal.

Tampouco somos os agressores que alguns jornais e blogs de direita tentam classificar, não fomos para a porta do Clube Militar para impedir uma simples reunião de anciãos. Aqueles homens prenderam, cassaram, torturaram, estupraram e mataram utilizando-se da prerrogativa de estar protegendo o país. Fomos para lá para dizer que não, eles não podem comemorar um regime atroz, eles não podem se vangloriar de crimes cometidos. Estes criminosos não são heróis e a população não se orgulha deles! Foi isso que fomos dizer na porta do seu clube.

Muitas pessoas morreram no Brasil nas mãos daqueles homens para que pudéssemos ter o direito de dizer o que pensamos a estas mesmas pessoas foi negado o direito a ter memória e é por eles que fomos pra lá. Enquanto essa memória não for revelada a luta delas estará viva, é a nossa luta, por isso fomos para a rua no dia 29 de março.

Os ânimos estavam exaltados, obviamente estavam. Do nosso lado tínhamos pessoas dos seus 60, 70 anos que haviam sofrido todas as violências do regime e aqueles caras passam rindo, fazendo galhofas e gestos obscenos como quem diz: “olha aqui, nós fizemos o que fizemos e vocês nunca vão ter de volta a dignidade ferida.” Um confronto estava se tornando quase que inevitável e nós talvez pela arrogância da juventude acabamos não percebendo.

Quando estourou a confusão e o gás veio na minha direção comecei a ficar tonto e corri, de repente uma forte dor no braço esquerdo me fez perceber a pancada, olhei no rosto do PM ele viu que me feriu. Meu braço ficou pendurado e eu ali olhando pra ele assustado, quando ele ameaçou me bater de novo outras pessoas chegaram perto e parece que o valente ficou receoso e saiu de perto.

No primeiro momento, humano que sou, confesso que tentei sentir raiva do PM que me atacou, hoje não sinto absolutamente nada a respeito desse cara, não porque acredite que ele seja um cara bom que estava ali só fazendo seu serviço, mas porque acredito que esse sujeito e suas atitudes violentas são só mais um reflexo da lógica na qual as forças de segurança são formadas no Brasil.

Se a polícia de hoje ataca manifestantes ela o faz devido ao que aprendeu com o regime militar, a violência é a mesma do passado, o sentido de haver um inimigo a combater é o mesmo, só foi transferido dos agentes que lutavam contra o regime para a população de modo geral e principalmente para a população que tem coragem de colocar sua cara na rua.

Desde o dia seguinte os “dignos senhores octogenários” como que relembrando o que faziam no regime de exceção começaram a ameaçar a mim e alguns outros companheiros que estavam no ato. Nossas fotos, nomes e locais de trabalho foram amplamente divulgados na internet e eles se vangloriam em dizer que já estão de posse de dados mais particulares. Quanto a isso já acionamos a Justiça e o Ministério da Defesa, afinal que história é essa? Os caras montam um DOI-Codi particular em pleno século XXI?

 Hoje sinto na pele o mal que um ato violento como o que me vitimou pode causar, é algo simbólico a aterrador, o medo passa a tomar conta não só de quem sofreu, mas, sobretudo dos que estão ao redor, é terrível ver quem você gosta sofrendo por causa do seu sofrimento.

Por hora quero agradecer a todos que se mobilizaram para me ajudar desde o momento em que fui atacado até agora, minha especial gratidão a minha companheira Ana, a minha mãe Sebastiana, ao Mondego, Ricardo, Volpato, Regina, dona Amelinha e Vladimir. Bom saber que vocês existem!

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