Por Rogério Tomaz Jr.
Em agosto
de 2011 as Organizações Globo lançaram, com grande estardalhaço, um documento
intitulado "Princípios Editoriais", contendo as "normas e
condutas que os veículos do grupo devem seguir para que seja cumprido o
compromisso de oferecer jornalismo de qualidade", conforme noticiou o G1,
portal do grupo.
Quem
conhece minimamente o histórico dos meios de comunicação da família Marinho –
no conjunto da população brasileira, é um contingente ínfimo de pessoas – sabe
que os tais "princípios" não passam de alegoria, balela, conversa pra
boi dormir, (mais uma) tentativa de iludir ou enganar incautos sobre a verdeira
natureza do grupo Globo: uma instituição política disfarçada de empresa de
informação e entretenimento.
Indo ao que
interessa, na edição do Jornal Nacional – principal produto jornalístico da
Globo, que é assistido todas as noites por dezenas de milhões de pessoas em
todo o Brasil – de terça-feira (31/1), foi exibida uma reportagem sobre a
visita da presidenta Dilma a Cuba.
A abordagem
da emissora, que considera Cuba uma ditadura onde a liberdade é sufocada e o
povo vive oprimido, não espanta e nem sequer incomoda muito, embora a
parcialidade se transforme muitas vezes em desonestidade.
“O diabo
está nos detalhes”, diz um célebre ditado inglês.
No
encerramento da matéria, o apresentador William Bonner leu nota que seria uma
manifestação da Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Câmara Federal. Para isso
o JN recorreu ao 2º vice-presidente do órgão.
“Sobre as
declarações de Dilma, o vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da
Câmara, Arnaldo Jordí, do PPS do Pará, lamentou que o governo brasileiro tenha
deixado a garantia dos direitos individuais fora da pauta de discussões em
Cuba. O deputado disse ainda que a comunidade internacional não aceita mais a
privação de direitos como a liberdade de expressão e de organização política”.
(William Bonner, JN, 31/01/2012).
Curioso a
emissora ter recorrido à terceira pessoa na hierarquia da CDH – a presidenta é
a deputada Manuela D’Ávila (PCdoB-RS) e o 1º vice-presidente é o deputado
Domingos Dutra (PT-MA) – apenas para garantir a manifestação de um deputado que
faz oposição ao governo federal, embora apresentado como porta-voz de uma
instituição especializada nas questões de direitos humanos.
Questionei
a deputada Manuela D’Ávila pelo Twitter e ela confirmou que não foi procurada
pela reportagem, como eu suspeitara. E falei por telefone com o deputado Dutra,
que também não foi contatado pela Globo.
O fato
grave, gravíssimo, é que a emissora, ao ignorar a hierarquia institucional da
Comissão de Direitos Humanos, apenas para emprestar à sua reportagem um ar de
isenção e legitimidade que o órgão reconhecidamente possui, desrespeitou o
órgão e, assim, assinou o atestado de partidarização da pauta, o que fere os
seus princípios editoriais (leia abaixo).
Pior ainda,
pregou uma peça em toda a audiência do telejornal, que saiu com a impressão de
ter ouvido uma declaração da Comissão de Direitos Humanos criticando o governo.
Essa é a
ética da Rede Globo. Esse é o respeito pelos princípios editoriais que os
herdeiros de Roberto Marinho assinaram, em nome dos seus filhos e netos.
Da Manuela
D’ávila e de Domingos Dutra, a Globo jamais arrancaria uma crítica à postura do
governo de não abraçar a pauta da oposição, que só fala de direitos humanos em
países inimigos dos EUA: Cuba, Irã, Venezuela, entre outros.
Jamais você
vai ouvir alguém do PSDB ou do DEM (ou algum veículo da Globo) falar – talvez
algum político do PPS fale – sobre as violações de direitos humanos no Iraque,
no Afeganistão, na Arábia Saudita ou mesmo nos EUA, que tem extensa folha
corrida de desrespeito aos direitos básicos da sua própria população.
Daí a
forjar uma manifestação da Comissão de Direitos Humanos da Câmara é uma prática
típica dos assassinos que dizem, com as mãos ensanguentadas diante da vítima:
“a culpa é do punhal”.
Seria muito
importante, a bem da verdade, que a Comissão se pronunciasse a respeito dessa
fraude político-jornalística.
Lamentável.
Mas não surpreendente.
Mais uma
vez, a Rede Globo mostra – ainda que sutilmente – a sua verdadeira natureza:
uma organização política.
Leia alguns
trechos dos Princípios Editoriais da Globo que rejeitam a partidarização do
trabalho noticioso http://g1.globo.com/principios-editoriais-das-organizacoes-globo.html
*****
Um jornal
de um partido político, por exemplo, não deixa de ser um jornal, mas não
pratica jornalismo, não como aqui definido: noticia os fatos, analisa-os,
opina, mas sempre por um prisma, sempre com um viés, o viés do partido. E
sempre com um propósito: o de conquistar seguidores. Faz propaganda. Algo bem
diverso de um jornal generalista de informação: este noticia os fatos,
analisa-os, opina, mas com a intenção consciente de não ter um viés, de tentar
traduzir a realidade, no limite das possibilidades, livre de prismas. Produz
conhecimento. As Organizações Globo terão sempre e apenas veículos cujo
propósito seja conhecer, produzir conhecimento, informar.
(…)
h) É
imperativo que não haja filtros na composição das redações.
i) As
Organizações Globo são apartidárias, e os seus veículos devem se esforçar para
assim ser percebidos;
As
Organizações Globo serão sempre independentes, apartidárias, laicas e
praticarão um jornalismo que busque a isenção, a correção e a agilidade (…).”
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