Como no Big
Brother, existe uma maneira muito simples de a gente parecer mais interessante
do que de fato é diante de uma multidão. Basta criar uma conta no Facebook e
manifestar desprezo por qualquer coisa que seja popular. Como o Big Brother ou
o Orkut.
Em janeiro,
quando as inserções do Pedro Bial passam a ser mais frequentes na tevê, o
movimento de pudores eletrônicos ganha um tom de campanha política.
Depois do
Facebook, ficou muito fácil manifestar nossos bons gostos e engajamentos pela
internet.
Depois que
inventaram as correntes de Facebook (espécie de tevê a cores a substituir o
pré-histórico jogo da velha que indicava uma hashtag), ficou muito fácil
manifestar nossos bons gostos e engajamentos pela internet.
Basta
compartilhar as fotos com as inscrições “Odeio BBB”, “Fora Pedro Bial”, “Meu
sofá da sala não é privada”, “Morte ao Paredão”.
Pega muito
bem.
Se houvesse
um guia prático do internauta moderno (sim, porque existem os internautas da
velha guarda, uns que se deixarem mandam até a íntegra da missa aos domingos),
a ojeriza aos reality shows seria a regra número 1.
Mas não só.
Para
parecer um cara muito legal na internet e na vida, é preciso também:
- Bater no
Michel Teló. Sem dó. Como se ele fosse o Sarney. Todo mundo vai pensar que você
morre de saudade dos tempos do sertanejão de raiz, ainda que o mais perto que
você tenha chegado de um boi foi naquela visita ao Pet Zoo;
- Ter
sempre em seu mural algum auto-retrato pintado da Frida Khalo (serve uma foto
em preto e branco) e desenhos estilizados do Tarantino, do Almodóvar, do Che
Guevara e daqueles quatro meninos de Liverpool atravessando a zebra de
pedestres em Abbey Road. Não é preciso esclarecer a conexão entre eles;
- Fazer um
minuto a minuto sobre a sua ansiedade pelo próximo show dos Strokes ou do
Arcade Fire no Brasil. De preferência, sem pontos de exclamação nos posts, para
não ser confundido (a) com fã de pagode;
- Vale a
pena também iniciar, em sua página, uma contagem regressiva para a Feira
Literária Internacional de Paraty. Pode começar em qualquer época do ano:
“Faltam 291 dias para Flip”;
- De vez em
quando, diga como anda sua vida acadêmica e comemore em letras garrafais quando
chegar a formatura. Não se esqueça de dizer que A-M-A a profissão escolhida. No
Facebook não existe gente frustada no campo profissional;
- Conte
sempre coisas fofas vividas em ambiente familiar, ainda que te digam que o que
se vive entre quatro paredes deva ficar entre quatro paredes;
-Vai a
Paris, Roma, Viena ou Nova York? Avise todo mundo pedindo dicas de lugares para
os amigos. Chegando lá, não espere a volta para postar impressões e fotos,
ainda que você passe 90% do seu tempo livre na sala de internet do hotel;
- Não
importa que o Parque Nacional do Xingu fique em Mato Grosso: seja sempre contra
qualquer intervenção humana no Pará. Se não colar, lembre também que o País da
corrupção não está pronto para receber eventos do porte de uma Copa, uma
Olimpíada, um Cirque du Soleil;
- Lista de
artistas brasileiros que DEVEM constar das suas preferências musicais: João
Gilberto (aquele do “vai, minha tristeeeeeza…”), Chico Buarque (“estava à toa
na vida, o meu amor me chamou”), Cartola (ver também: Mangueira. É um morro,
além de escola de samba), Noel (o daquela caricatura com nariz grande, cigarro
meio desprendido na boca…), Pixinguinha (o moço das bochechas). Engenheiros do
Hawaii e Roupa Nova, que te levaram às lágrimas depois daquele fora no
colegial, NEM PENSAR. Mantenha certa distância também de Raul Seixas (tiozão
demais, coisa de hippie doido);
-Tome duas
doses de Clarice Lispector todos os dias. Adicione, de vez em quando, aquele
poema da Fidelidade do Vinícius de Moraes (“de tudo ao meu amor serei atento
antes…”) e algum pensamento do dia escrito por Mário Quintana ou Caio Fernando
Abreu (se não tiver nenhum livro deles em casa, jogue no Google alguma letra sobre
despedidas cantada pelo Alexandre Pires. Se não citar a autoria, todo mundo vai
achar o máximo). Se estiver de bom humor, use qualquer frase atribuída ao Luís
Fernando Veríssimo. Em dias de mau humor, use Arnaldo Jabor (o cineasta e o
comentarista são as mesmas pessoas, mas não parece);
- Faça
print screen de erros gramaticais alheios e compartilhe, em tom de lamento, o
que você considera um erro grosseiro. De quando em quando, solte um: “Maldita
inclusão digital”. É tiro e queda;
- Quando
algum autor de renome for dar aquela palestra marota no Sesc perto de casa,
marque dois ou três amigos em seu mural e provoque alarde para todo mundo
saber: “Vamos, né??????”. Não esqueça de postar o link relacionado;
- Curta a
página de qualquer bar com mais de cinco anos de fundação no entorno da rua
Augusta; dê preferência ao Ibotirama;
-Use e
abuse de qualquer onda retrô. Está sempre em moda;
-
Compartilhe diariamente sua indignação com a política nacional. Lembre todos os
dias que o governo não presta e que Brasília seria muito melhor se, no lugar do
Congresso, funcionasse um estacionamento. É de bom tom ignorar que os governos
totalitários do século XX também transformaram seus Legislativos em
estacionamento;
- Não
conte, nem sob tortura, que você adora passar no Mcdonalds depois do rolé pelo
Espaço Unibanco;
- Deixe
sempre claro que você é habitué de lugares incríveis, como as praias de
Trindade-Paraty ou o sofá do Outback;
-
Compartilhe qualquer reportagem relacionada ao D.O.M, o mais premiado
restaurante brasileiro lá fora, e expresse sua intimidade com o nome de Alex
Atala.
Feito isso,
você espantará qualquer fantasma da breguice e do lugar-comum que contamina
este país que a gente gosta de chamar de atrasado.
Ninguém vai
dar a mínima, mas o importante é ficar bem com a gente mesmo. Ou viver cada
minuto como se fosse o último. E dormir com a consciência tranquila. Ou
qualquer outro clichê que sirva.
Matheus
Pichonelli
Nenhum comentário:
Postar um comentário