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domingo, 29 de janeiro de 2012

São Paulo, 458 anos: Aniversário dos Protestos



por Maurício Costa de Carvalho, sábado, 28 de Janeiro de 2012 às 22:47
O último 25 de janeiro de 2012 já está marcado na história da capital paulista como o “Aniversário dos Protestos”. Desde a manhã, na tradicional missa da Sé, onde o prefeito Kassab valeu-se mais uma vez covardemente da força militar para reprimir violentamente os manifestantes, via-se que dessa vez os problemas não iam ser mascarados pela festa.  Foi assim também quando a voz do ato em frente abafou os discursos na solenidade da entrega das medalhas na Prefeitura e até no show do Ney Matogrosso onde espontaneamente a multidão xingou e cantou palavras de ordem contra o prefeito.

Embora o que mais tenha motivado os protestos seja a brutal e inaceitável violência de Estado com a qual o conluio Kassab-Alckmin tratou as questões sociais da Cracolândia e do Pinheirinho em São José dos Campos, o que estava em jogo nas manifestações nitidamente ia além. Implicitamente na ocupação do aniversário festivo com ações políticas e palavras de ordem estava o mais profundo cansaço do paulistano com este modelo inviável, autoritário, corrupto, desumano e elitista incrustado na cidade. Coube bem a consigna dos trabalhadores da cultura que ocuparam a Funarte no ano passado: “chegou a hora de perder a paciência”.

Segundo dados divulgados pela Rede Nossa São Paulo, 56% dos paulistanos se mudariam da cidade de pudessem. A lista de evidências que concorrem para esse número na cidade é infindável, dos itens avaliados sobre a percepção dos moradores – envolvendo transportes, educação, saúde, meio ambiente, etc. – 74% tiveram notas abaixo da média. Chama atenção em particular o dado sobre segurança: apenas 1% dos moradores de São Paulo sente-se totalmente seguro na cidade, enquanto 89% se sentem absolutamente inseguros.

Esses números contrastam frontalmente com o discurso e a prática de Kassab-Alckmin. Na gestão municipal o número de subprefeituras dirigidas por coronéis, militares da reserva, subiu para incríveis 29 de um total de 31. Ou seja, os órgãos gestores de boa parte do orçamento e que têm por tarefa organizar a cidade estão completamente militarizados. Ao mesmo tempo, a polícia de Alckmin é uma das mais assassinas do país. Segundo dados da Corregedoria, um em cada cinco assassinados em São Paulo é vítima da PM. Em resumo: militarização e segurança estão em lados opostos, exatamente ao contrário do que os governos e a PM dizem. Então, além do fetiche ditatorial do governo paulista, que em seu site exalta a ação militar na “revolução” de 1964, o que está por trás desse avanço repressivo?

Na cidade de São Paulo especificamente há um visível projeto de desenvolvimento urbano que, para garantir a valorização dos terrenos cobiçados pela especulação imobiliária é necessária a ação firme e decidida do Estado no sentido de organizar e executar os planejamentos que garantam os lucros estratosféricos das empreiteiras. A polícia tem um papel chave no plano das empreiteiras. São muitos Pinheirinhos e Cracolândias a serem desalojados, reprimidos, expulsos. São muitas Favelas do Moinho que, situadas em lugares valorizados, correm o risco de sofrer incêndios “misteriosos”.

As propostas de alterações no Plano Diretor da cidade, as concessões urbanísticas ao setor privado, as Operações Urbanas Consorciadas são variações de um mesmo tema: um modelo de cidade refém das empreiteiras que viabilizam seus projetos investindo nas campanhas eleitorais de candidatos a prefeitos e vereadores e cobrando retorno depois. E o retorno costuma ser bastante alto: para cada real investido pelas construtoras nas eleições de 2006, por exemplo, o retorno em contratos públicos é multiplicado 8,5 vezes.

Oficialmente PT, PSDB, DEM e PMDB são os campeões na arrecadação de doações das construtoras.  Não por acaso o presidente da Câmara dos vereadores Police Neto foi eleito sem oposição. Não por acaso, há um grande possibilidade do PT – animado por Lula – compor alguma aliança com o PSD de Kassab para eleger Fernando Haddad à prefeitura em 2012. Não por acaso, o PT tem feito oposição cosmética ou mesmo lavado vergonhosamente as mãos em situações de terrorismo de Estado promovidas pelo Governo do PSDB no Estado como no caso do Pinheirinho.

Infelizmente, com as ações que já se manifestam em torno da Copa do Mundo e das Olimpíadas será ainda maior a pressão das grandes empresas e investidores para que haja muito mais remoções. São mais de 11 milhões de pessoas no Brasil que vivem em situação semelhante às do Pinheirinho. Em São Paulo, segundo consta, a próxima vítima é uma ocupação da Frente de Luta por Moradia na esquina da Ipiranga com a São João. Não há dúvidas de que a Polícia, o Judiciário, o Legislativo e o Executivo serão chamados mais uma vez a exercer sua justiça de classe, ampliando a violência contra os pobres. E também não há dúvidas de que haverá resistência.

Do nosso lado, fizemos opção. O PSOL seguirá nas ruas como no Aniversário dos Protestos fazendo a parte que nos cabe, apoiando e nos somando a todas as manifestações da legítima impaciência por democracia real e pela justiça verdadeira. Enquanto a política do coturno for a tônica haverá gente disposta a fazer os responsáveis pela violência lembrarem de suas culpas onde estiverem. Enquanto o direito à moradia for um privilégio, as ocupações seguirão.

Ao mesmo tempo, queremos aproveitar as eleições deste ano para construir em São Paulo o debate real sobre a necessidade de outro modelo de cidade, onde haja uma reforma urbana que ocupe os imóveis desocupados e endividados das áreas centrais para suprir o déficit habitacional, que dê centralidade à periferia no planejamento e na gestão urbanas, que propicie a participação direta da população na decisão sobre o orçamento, que pense nas políticas de transporte, segurança, saúde, educação e cultura como parte de um projeto emancipador, onde os moradores de São Paulo tenham efetivo Direito à Cidade.

Maurício Costa
Presidente do PSOL da cidade de São Paulo

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